Em janeiro, enquanto muitos sentem o peso das promessas de um novo ano, a campanha Janeiro Branco se apresenta com um propósito aparentemente nobre: focar na saúde mental e emocional. No entanto, ao olhar mais de perto, é possível identificar lacunas significativas nessa iniciativa, especialmente quando analisamos sob a perspectiva da diversidade e da justiça social.
O Janeiro Branco tem como objetivo instigar reflexões profundas sobre nossas vidas e relações sociais. Contudo, ao utilizar uma “tela em branco” como metáfora central, ele inadvertidamente perpetua a invisibilização de vozes e intelectuais não brancos, repetindo uma narrativa que favorece a hegemonia eurocêntrica. Essa escolha cromática simboliza não apenas a limpeza, mas também o apagamento cultural de figuras como Juliano Moreira e Frantz Fanon, cujas contribuições são sistematicamente marginalizadas.
A questão racial na saúde mental continua sub-representada. O sofrimento psíquico decorrente de racismos é raramente abordado nas discussões que emergem das campanhas de saúde mental, e Janeiro Branco não é exceção. Enquanto busca-se incentivar a terapia, faz-se isso de maneira individualizante, desconsiderando condições estruturais e o impacto da violência racial, interesses comerciais e a falta de fortalecimento de um sistema de saúde público, como o SUS, que poderia efetivamente promover uma abordagem mais abrangente do cuidado com a saúde mental.
É imperativo questionar a ausência de diálogos sobre a manicomização de corpos negros e sobre como a deshumanização diária dessas vivências permanece ignorada. Em vez de abordar essas questões de maneira integral, a campanha continua a sustentar os privilégios de uma parcela da população, permitindo que a branquitude mantenha sua posição confortável e sem conflitos.
Em nossa região, é crucial promover discussões que incluam narrativas diversas e realidades marginalizadas. Acreditar que a saúde mental pode ser tratada sem considerar as desigualdades sistêmicas é perpetuar um ciclo de exclusão e silenciamento. Precisamos ampliar o nosso olhar, rompendo com paradigmas que não nos representam, para que possamos, enfim, reescrever a história coletiva de maneira justa e inclusiva.